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Corrida: do instinto de sobrevivência ao prazer em estar vivo

Atualizado: 19 de abr. de 2022

Este texto foi publicado originalmente na Revista Inspira, edição #2, agosto de 2019.


Homem com bermuda correndo.

Foto: ijeab/ Freepik


Do instinto de sobrevivência aos recordes por centésimos de diferença. Quando começamos a correr e como os passos acelerados trazem benefícios à nossa saúde.



AONDE NOSSOS PÉS NOS LEVARAM

Tálus, calcâneo, cubóide, falanges, entre outros nomes não muito conhecidos formam a estrutura óssea de nossos pés. Cada pé é constituído por 26 ossos, no total. Eles são unidos pelos ligamentos e, assim, formam as articulações.


Como em uma máquina, cada peça tem sua função específica. Sem os dedos dos pés, por exemplo, nosso equilíbrio seria prejudicado. Nos dias de hoje, porém, essa deficiência é facilmente contornada com calçados ortopédicos.


Além de nos dar equilíbrio e apoio para andar, ao longo da história, os pés nos levaram longe, a distâncias continentais. Foi há 70 mil anos que os Sapiens saíram da África para pisar em outros continentes.


E o salto temporal é ainda maior se pensarmos quando nossos pés começaram a nos movimentar para a vida.


Ao lembrarmos os filmes que retratam a Pré-História, além da carne crua sendo destrinchada pelos dentes, uma das imagens subsequentes são dos humanos correndo – atrás da presa ou fugindo para não ser uma. A corrida, portanto, é um dos nossos primeiros mecanismos para a preservação de nossa vida.

A CORRIDA NA HISTÓRIA

Alguns longos passos temporais depois – mesmo ainda longe de nossos pés calçados com inúmeras marcas comerciais -, ali pelas proximidades do Antigo Egito, o faraó Taraca, da XXV dinastia, criou uma corrida de longa distância para desenvolver o prepara físico de seus soldados.


Hoje, os "modestos" 100 km do faraó Taraca são percorridos não por soldados, e sim por corredores que levam aos limites seus desempenhos. Conhecida como Pharaonic 100 km, a ultramaratona começa na pirâmide de Hawara, em Faium, e tem sua linha de chegada nas pirâmides de Sacara, no Cairo.


Próximo da época do faraó Taraca, mas em outro continente, jogos que incluíam a corrida começavam a movimentar a sociedade de Atenas, na Grécia.


Os Jogos Olímpicos da Antiguidade - datados de terem início entre 774 e 776 antes da Era Comum - eram um festival que misturava esporte e religião. De quatro em quatro anos, a pé ou carregando armas, os corredores honravam a Zeus e a outras deidades percorrendo distâncias muito menores que as das maratonas atuais - às vezes, menos de 500 metros.


Ainda dos tempos da Grécia Antiga, reza uma lenda que durante a Primeira Guerra Médica, entre os gregos e os persas, em 498 antes da Era Comum, um homem chamado Pheidippides ficou encarregado de levar a notícia da vitória grega a Atenas.


Então, ao chegar ao seu destino, o homem, que supostamente teria corrido cerca de 35 quilômetros, após contar a informação, caiu morto. A batalha que os gregos venceram teria sido a de Maratona – palavra que inspirou os primeiros Jogos Olímpicos da era moderna, realizados em Atenas, a partir de 1896.


Outros, no entanto, relatam que a história de Pheidippides foi ainda mais heroica. Nessa outra versão, o homem teria corrido 240 km de distância, de Atenas até Esparta, não para informar sobre a vitória na guerra, e sim para pedir reforços.


ESPORTE DEMOCRÁTICO

A corrida é associada a outro termo que também remete à Grécia Antiga. Ela é considera um esporte democrático, tendo em vista sua facilidade de execução. Quase qualquer pessoa pode correr, em quase qualquer lugar. Basta calçar um tênis, ou mesmo descalço na areia da praia, e colocar o corpo em movimento.


Existem várias modalidades de corrida, desde as com 100 metros, em que a explosão de velocidade e a cadência dos passos do atleta são fatores importantes, até as maratonas com seus 42 km ou mais, em que a resistência é o que faz cruzar a linha de chegada e levantar os braços à frente de outros corredores.


A corrida é tão versátil que há nomes específicos para cada ambiente. As corridas Cross Country, por exemplo, são feitas em terreno aberto; a corrida na montanha, como o nome já diz, é um percurso repleto de subidas e descidas em montanhas; já na corrida trail, os passos são dados em trilhas, bosques ou praias.



Dentro dessa gama de possibilidades, a dica mais frequente para quem está começando no esporte é fazer intervalos entre corridas leves e caminhadas. Com o tempo, o preparo físico será desenvolvido juntamente com a resistência, e a quilometragem aumentará gradualmente.


Sendo assim, você não precisa ser como Pheidippides e correr 35 ou 240 km, nem mesmo disparar por 100 metros em pouco mais de 9 segundos, como fez Usain Bolt, o multicampeão olímpico de nossos tempos. Esse “pouco mais”, em verdade, são 58 centésimos. Para Pheidippides talvez essa fração de segundo não salvasse os gregos do ataque persa, mas para Bolt são eles que o coroam com um recorde mundial.


CORRENDO EM BUSCA DE SAÚDE

Que a corrida é um esporte chamado de democrático pela facilidade de praticá-lo, nós já sabemos. Mas você sabia que há vários benefícios na saúde com aqueles passos acelerados?


Esses mesmos passos acelerados funcionam como antídoto para outro tipo de passos acelerados: os passos dados para conseguir cumprir os compromissos e que causam o estresse.


Foi o que mostrou uma pesquisa realizada pelo GEPECOM da Universidade de São Paulo (USP). Dos 1.154 que participaram do levantamento, 90% apontaram que se sentem menos estressados após uma corrida.


Os estudos científicos estão a passos largos confirmando os benefícios da corrida. Segundo uma revisão de evidências publicada na revista Progress In Cardiovascular Diseases, os corredores vivem três anos a mais do que os não corredores.


Na mesma revisão, os autores ainda afirmam que uma hora de corrida aumenta a expectativa de vida em sete horas. Ou seja, não precisamos de muito tempo para que a corrida tenha impacto positivo em nossa saúde.


Se você não consegue correr, caminhar também traz benefícios à saúde. É isso que defende o neurologista José Ángel Obeso, diretor do Centro Integral de Neurociências de Madri, na Espanha.


Segundo o neurologista, a rotina é inimiga do cérebro. Portanto, quando caminhamos, a mente fica mais ativa e alerta, porque nossa atenção se foca nos movimentos e no ambiente. Muito além do emagrecimento, o exercício provoca a ebulição de todos os hormônios ligados à felicidade e nosso cérebro nos deixa mais otimista.


Com o passar dos dias, a caminhada tem efeito terapêutico: o cérebro é oxigenado e por consequência isso desencadeia até mesmo numa melhora na criatividade. Movimentar o corpo transforma a mente; e a mente transformada modifica o corpo.


Há outro benefício da prática de exercício que também ocorre na cabeça. A transformação ocorre mais especificamente no hipocampo, a parte responsável pela memória e pela capacidade espacial. Segundo investigações realizadas em camundongos pelo The Salk Institute for Biological Studies, a prática de exercício pode estar diretamente ligado à plasticidade cerebral, que é a capacidade de criarmos novos neurônios em qualquer fase da vida.


Que tal, então, evitar chutar o balde para dar o pontapé inicial correndo em busca de saúde?


Mas antes de começar, se possível, lembre-se de estar com exames médicos em dia.


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